Fui seguindo a mureta dos fundos da igreja Madonna de Idris atenta às ramificações que as trilhas faziam rumo às famosas cavernas da Matera, lá do outro lado do penhasco. Avistei uma ponte de cordas e madeira.
Cortei caminho até chegar à Via B. Buozzi, fui descendo até a igreja San Pietro Caveoso, onde novamente topei com a mureta em um trecho que dava acesso à trilha. Ali um informativo: Parco Regionale della Murgia Materana.
Parque Regional da Murgia Materana
Dentre as explicações do informativo, constava que as cavernas espalhadas pelo vale foram usadas ao longo do tempo para diversos fins, como moradia, sarcófagos e local de cultos religiosos.
Meio ressabiada, pus um dos pés na trilha e olhei para os lados. Nada de câmeras. Nada de seguranças. Na companhia do vento gelado que jogava meu corpo para trás, me aprumei e fui descendo a trilha devagar, curtindo aquela excursão inusitada. De longe, eu registrava as diferenças de tamanho das “cavernas-moradia”. Isso me fez questionar se, mesmo naquela época, já existia uma proto característica da “sociedade moderna” em que o neanderthal mais bem sucedido adquirisse os melhores imóveis.
Rindo dos meus próprios pensamentos, à medida que eu me aproximava do rio, o “vento encanado” se fez em infinitas rajadas que congelavam meu couro cabeludo e orelhas. Em compensação, o característico som das águas me acompanhavam aliciante. Por outro lado, as sombras e os paredões do penhasco fechavam meu ângulo de visão, pois o vale cavado pelo rio é bem escarpado. Concentrei-me no leito do rio Gravina, de cujas margens eu me aproximava.
O rio Gravina (Matera)
Embora a água fosse um tanto turva, não exalava qualquer odor. O pouco volume me fez pensar sobre quais foram os fatores a cavar um penhasco tão escarpado, pois não me parecia obra exclusiva do rio. Arrisquei-me equilibrar nas pedras do leito para chegar até a água. Não percebi nela o tato um tanto engordurado típico dos esgotos domésticos. Indústrias não havia. Talvez não fosse um rio poluído. Tomara. O ruído da corredeira era bem alto para o pouco volume de água. Talvez fosse o eco dos paredões.
Fui seguindo o leito rumo à ponte. Os paredões eram muito altos e as rochas calcárias se mostravam estratificadas, indicando sedimentação em camadas. E deviam ser mesmo bem maciças porque os estudos arqueológicos apontam as escavações do centro histórico como pertencentes, pelo menos, ao Paleolítico (primeira fase da pré-história). Já as cavernas se diz serem habitadas, sem interrupção, desde a idade do bronze (Neolítico: terceira fase da pré-história).
A ponte Tibério
Eis a ponte. Dei uns pisões para sentir se chacoalhava. E muito! Mas era segura.
A travessia da ponte descortinava novos ângulos de visão em que as grutas saltavam aos olhos de ambos os lados do penhasco. Eu subia a ladeira devagar, absorvendo cada novo detalhe. Um deles foi os fundos de San Pietro Caveoso, lá no alto, em que aparece uma ponte em estilo romano e um portal de acesso sabe-se lá para onde. Deu vontade de escalar para saber qual é.
A certa altura encontrei uma moça com ar meio reticente que me olhou bem nos olhos. Como as trilhas estavam vazias, deduzi que ela estava com medo e ofereci minha humilde companhia. Seu nome era Helena, natural da Toscana.